O G.R.E.S. Acadêmicos do Sossego

O G.R.E.S. Acadêmicos do Sossego, orgulhosamente, atravessa a baía da Guanabara rumo à capital, onde desembarca o seu povo trazendo no rosto o sorriso de Niterói e a força da Batalha em sua raiz para mais uma vez fazer Carnaval.

Saudamos as águas, saudamos o mar.

Pedimos licença.

Essas mesmas águas que nos separam da África, nesta noite, nos ligarão de novo a nossa ancestralidade.

Celebramos “Os Tambores de Olokun”, grupo percussivo e de dança carioca que homenageia o sagrado orixá da nação Nagô Egbá.

Olokun é pai e mãe de Yemanjá. É a divindade guardiã das profundezas do mar e uma das mais poderosas da religião Osha-Ifá. O sincretismo de religiões africanas que deu origem ao Candomblé frutifica na forma de manifestações culturais e artísticas brasileiras. Em Pernambuco este fato deu origem ao Maracatu e seu cortejo real, que há mais de um século coroa a negritude brasileira.

Por tanta admiração a todos os elementos sagrados e profanos que envolvem o folguedo, no ano de 2012 nasce um grupo que realiza oficinas de percussão e dança, respeitando e contribuindo para divulgar tradições musicais, históricas e religiosas da nossa identidade afro-brasileira, transformando a vida de inúmeras pessoas através da sua arte singular, trazendo ao Rio de Janeiro um pedacinho de Pernambuco.

Viva Olokun!

Viva o Maracatu!

Viva os tambores que jamais irão se calar e as saias que jamais irão parar de rodar!

Prelúdio das Águas
“Eu saúdo o Senhor dos Oceanos.
Cuja grandiosidade não me cabe entender.
Olokun, minha fé é tão grande quanto a quantidade de água existente nos mares.
Da mesma forma permita que haja paz em meus caminhos!
Olokun, espírito imutável a quem reverencio com muito respeito!
Axé, axé, axé!”

Antes de tudo vieram as águas. Águas que caíram do alto e formaram os domínios marinhos. A terra é um infinito azul banhado de vida pelos oceanos que separam e unem histórias que se contam pelos quatro cantos do mundo.

Tudo o que se vê no azul-marinho é domínio de Olokun. Ora azul-sossego no cristalino espelho d’água, ora azul-mistério em profundezas intocáveis.

O senhor dos mares habita a infinitude dos abissais, onde ergueu o seu reino de encante com seu séquito de tritões e ninfas do mar. Sua presença é evocada pelo ressoar de grandes conchas que ecoam triunfantes por todos os mares.

Olokun é senhor de tambores sagrados. Tambores de misticismo. Tambores da paz e da guerra. Entregues aos homens, sagrou-se a ritualística: Ilú dos oceanos, Ilú do estrondar das ondas. Ilú-Olokun, os tambores do mar.

Enlaces Culturais em Pernambuco. Este mesmo oceano que banha a terra-mãe da nossa ancestralidade se arrebenta nos arrecifes de um pedaço da nossa história brasileira. Desta vez, sem separação, o mar é o laço de união.

Esta terra era a “paranãpuka” dos Tupi. O mar furado, abundante de peixes, provedor da fartura aos povos de pele morena, sentinelas primeiras que ostentavam altivos seus diademas de pena.

Este mesmo mar trouxe estranhos de um velho mundo. Desembarcaram lusitanos, franceses e holandeses em “Fernambouc”, deitando seus olhos de cobiça sobre o rincão onde aprendeu-se a liberdade: entre flechas e tacapes, facas, fuzis e canhões.

Acorrentaram povos de África durante a diáspora da negra pele. As mãos calejadas no suor da labuta e no girar das moendas ergueram a prosperidade da capitania sob o sol inclemente do nordeste brasileiro.

Daí, formaram-se laços múltiplos, brasilidade. As palavras se misturaram, a arte entrelaçou a história e o tempo esculpiu Pernambuco adornada de suas belezas naturais. As ruas tão belas, ladeiras de pedra e o contraste da tua gente alicerçada com fé na justiça. Essa gente forte, leão do norte.

Eu sou mameluco, eu sou de Casa Forte
Sou de Pernambuco, eu sou o Leão do Norte

A Corte da Senhora do Rosário

Em meio a tantas idas e vindas, os tambores do senhor dos mares se transformaram em tambores culturais do povo negro. Se ergueu o estandarte para anunciar o reinado do povo de pele preta na cidade: É o Maracatu! É folguedo que ecoa na poesia do cantador: Nosso rei que veio de África. Rainha se coroou. Nagô, nagô, rainha se coroou.

O cortejo toma forma com os seus personagens fascinantes. Damas do Paço portam a Calunga. Os caboclos de pena saúdam Arreamar. Chegam também os lanceiros reais. Príncipes e princesas completam a corte, para enfim, anunciar os soberanos reais. Os tambores tocam, a corte dança e desfila, o sorriso está no rosto, o maracatu na rua!

Os homens pretos e as mulheres pretas uníssonos em loas de afirmação da sua identidade cultural. Os homens pretos e as mulheres pretas, estrelas brilhantes de uma noite que se faz silenciosa por gratidão a Senhora do Rosário.

Depois as alfaias, gonguês, agbés e atabaques tocam em liberdade para Dona Santa e Mestre Luís de França. Madalena, Firmina Gomes, Eudes Chagas e Badia. Por todos os predecessores que lutaram para dar vez e voz ao folguedo da negritude.

Os Tambores de Olokum

Lá no morro venta forte e se escuta as pancadas do mar
A lua clareou o reino de Olokun. E do Orum Despencou as estrelas pro mar

As águas continuaram a ir e vir beijando as areias, levando o tempo e trazendo de volta a vontade de despertar as consciências para os valores culturais afro-brasileiros que pulsam em nossa história.

Os tambores do senhor dos mares ressurgem na cidade do Rio de Janeiro sob a forma de um grupo de percussão e dança, erguendo então, o estandarte da valorização das raízes históricas do Maracatu. Tradições seculares que permanecem vivas através das Nações de Pernambuco, e no Rio de Janeiro, pelo trabalho de grupos que reúnem centenas de pessoas durante o ano e outras tantas durante o carnaval carioca.

O Tambores de Olokun é um desses grupos e seu cortejo também acontece nas ruas, o palco do povo. A arte é do povo, o canto é do povo. O povo liberto de preconceitos e das amarguras do dia a dia.

Tocam os tambores, o chão estremece. Rodam as saias, gira o mundo. Os Tambores de Olokun pedem passagem irmanados ao azul-sossego de nosso pavilhão em seu jubileu de ouro. É o congraçamento, celebração. É o povo que não esmorece, e feliz, carrega consigo o orgulho de sua história repleta de glórias.

Que ressoem os tambores da consagração!
Os tambores do largo da batalha!
Os tambores de Olokun!

“Os Tambores de Olokun”

Carnavalesco: Marco Antônio Falleiros
Pesquisa e Texto: Diego Araújo
Contribuição: Alexandre Garnizé, Juliana Sotero e Tatiana Paz / Tambores de Olokun

Referências Bibliográficas

IPHAN. INRC do Maracatu Nação. Inventário Nacional de Referências Culturais. 2011-2012.

ALMEIDA, L. S. de; ARAUJO, Z.; CABRAL, O. (Orgs.). O Negro e a construção do
carnaval no Nordeste. Maceió: EDUFAL, 1996.

CUNHA, M. W. C. da. O Som dos Tambores Silenciosos: Performance e Diáspora Africana nos Maracatus Nação de Pernambuco. 2009. Tese (Doutorado em Antropologia). Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2009.

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