SINOPSE REVISADA DO GRES SÃO CLEMENTE PARA O CARNAVAL 2018

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Sinopse do enredo “Academicamente Popular” – Carnaval 2018

 

 

Vindos da fria Europa, com a missão de fundar no Novo Mundo uma nova Academia artística, os célebres virtuosos do Império Napoleônico desembarcam nas águas quentes da Guanabara, trazidos pela vontade soberana de Dom João. Em suas malas, a riqueza da bagagem Neoclássica: réguas, esquadros, pincéis e manuais, o desejo de “civilizar” através da força de seus ícones culturais. Fundam a Escola Real de Ciências Artes e Ofícios para organizar o ensino das artes e estabelecer uma linguagem estética oficial para a corte da nova capital. A nobre arte francesa toca o solo brasileiro para fincar suas raízes e edificar seus conceitos, erguendo colunas de saberes. Era seu destino semear essa nova terra, incrivelmente fértil de possibilidades.

 

A beleza sempre foi a mais cobiçada de todas as bênçãos. Através dos tempos, o homem buscou a forma ideal, a sensação plena da estética. Desde a Antiguidade Clássica, o belo era tratado e considerado uma dádiva dos deuses e cultuado pelos mortais. A arte sempre foi objeto de encantamento e despertar dos sentidos, emoções e sensações – uma das ferramentas mais importantes na construção das alegorias da mente humana.

 

O povo sempre buscou a força da arte para se entender humano e transcender o “ser humano”, como partes complementares de uma mesma existência.

 

Quis o destino que esse peculiar encontro ganhasse novos e singulares contornos nas terras do Novo Mundo, banhado pelo Atlântico, emoldurado por um verde exuberante. Musas da arte sopraram através dos mares misteriosos às mentes de nobres artistas até a nova capital do império português. Tal encontro só poderia surgir nessa terra privilegiada, isolada entre o mar e montanha, que chamamos São Sebastião do Rio de Janeiro. O encontro entre a arte acadêmica e as forças ocultas que nascem do povo: no caso, um povo mestiço, matizado com tons nativos e africanos. Somente aqui seria possível conceber tal mistura, entre a acadêmica arte e a espontaneidade dos mais calorosos corações.

 

Rapidamente, a força desse cenário captura a alma de Debret, que eterniza em aquarela a diversidade desse novo mundo que surgia. O olhar do talentoso artista foi enamorado pela beleza local e pelo esplendor de nossa mestiçagem. Em suas pinceladas, registrou o cenário da capital do Império, com todos os seus contrastes. Impossível ficar indiferente aos cânticos vindos das ruas, onde o entrudo tomava as praças em dias de festejo carnavalesco, como um cronista visual buscava o exótico, o cotidiano, os viveres dessa gente. Sua obra testemunhava a fluência do encontro de nossas matrizes culturais. Um Rio onde a negritude predominava caminhando por um cenário de arquitetura colonial.

 

Com o passar dos anos, as primeiras gerações de artistas acadêmicos brasileiros são formadas. Em suas obras, davam vida e cor a importantes passagens da história nacional: momentos de esplendor da corte, cenas de batalhas e a glória do exército ganham contornos épicos na visão dos artistas. A figura do índio surge nas telas como herói nacional. Era nos grandes salões anuais que eles expunham o resultado de seus estudos. Os que mais se destacavam nas competições eram premiados com medalhas e recebiam uma bolsa para completar seus estudos em renomados ateliês da Europa. Ao retornar ao Brasil, postulavam a vaga de professor titular ou substituto. Gradativamente, a primeira geração de mestres estrangeiros era substituída por brasileiros. Os princípios franceses de igualdade norteavam essa transformação: sem restrições, a Academia se abria a receber os estudantes, independentes de sua origem social ou da cor da sua pele. Um exemplo disso foi a importante presença de Estevão Silva: negro, filho de escravos, que chegou a rejeitar publicamente uma premiação das mãos do Imperador, que não fazia jus ao seu talento.

 

Passo a passo, a Academia vai se entrelaçando com o Brasil, como raízes firmes que abraçam o solo, se misturando a ele e extraindo sua essência. Impossível não se deixar levar pela grandeza deste verdejante país. O calor dos trópicos e a luminosidade seduzem o olhar dos artistas, sensibilizando sua paleta para os infinitos tons que nossa paisagem é capaz de produzir. A natureza brasileira “não cabia nos manuais”. Era preciso levar o cavalete até o bosque e se permitir sentir a mensagem que ecoava da mata, advinda dos troncos, dos riachos, das flores e do canto dos pássaros.

 

A cada geração a Academia buscava mais e mais uma identidade nacional, trazendo para o foco dos artistas o cotidiano, o folclore, as causas sociais e políticas. Sobretudo, a Escola se permitia vivenciar ares de modernidade e inovação, trazendo ao âmbito das discussões plásticas as transformações da sociedade. Os tipos brasileiros, o caipira, o interior – os caminhos vão se abrindo e a mentalidade começa a mudar.

 

A estética mudou… As técnicas mudaram… Os temas mudaram… Novas linguagens são incorporadas… A cultura popular se torna objeto de estudo e reflexão dos artistas e intelectuais. Com o passar dos anos, a Academia foi se transformando, sem jamais abrir mão de sua importância e seu papel. Os salões da tradicional escola se abrem para a modernidade, que cresce vigorosa como uma árvore que se ergue ao futuro, mas com raízes fortemente fincadas as suas origens.

 

Nessa terra de misturas raras, a bagagem clássica se entrelaçou nas folhas das palmeiras, no canto das lavadeiras, se coloriu com os tons da alegria e se fez carnaval. Basta olhar para a natureza do nosso povo para fazer crer que a missão desta Academia era ser popular. Ainda no começo do Século XX, o professor Rodolfo Amoedo tomou o pincel e emprestou sua arte ao estandarte do Ameno Resedá: um lampejo de um grande casamento que viria a seguir. Salve o casal Nery, professores pioneiros na aproximação desses dois mundos, trazendo a viagem pitoresca de Debret ao Salgueiro de 1959! Salve Mestre Pamplona, que, com a benção de Campofiorito, realizou esse encontro entre os filhos da Academia e a arte do povo, guiando uma geração inteira de artistas para as escolas de samba nos anos 60 do Século XX.

 

O clássico e o popular encontram abrigo no carnaval. Desde a chegada da Missão em 1816 até hoje, o tempo moldou a Academia e abriu suas portas à cultura nacional. O barracão da escola de samba tornou-se um grande ateliê, onde arquitetos, pintores, desenhistas, figurinistas, realizam todos os anos a “missão” de criar e recriar a fantasia do carnaval. É missão da São Clemente, uma escola essencialmente carioca, eternizar na passarela esses mais de 200 anos de arte e cultura dessa instituição moldada e emoldurada pelas curvas sinuosas do Rio de Janeiro, que, amorosamente, carregamos em nosso pavilhão.

 

Foram grandes as barreiras e desafios vencidos. Até mesmo o fogo que atingiu a sede da EBA (Escola de Belas Artes) recentemente não tem o poder de apagar sua história. É das chamas que ela há de se reerguer, como uma Fênix que renasce: “quem chorava vai sorrir”.

Nessa ópera carnavalesca, nossa escola honrosamente apresenta sua tese, para ser avaliada pela banca popular, saudando a história da Escola de Belas Artes. Nossa defesa é o próprio desfile em si: ao adentrar a passarela em 2018, a escola de samba da Zona Sul será a grande confirmação de que era destino da EBA dar as mãos ao povo em forma de um carnaval Academicamente Popular. ”

 

Jorge Luiz Silveira – Carnavalesco

“O preto e amarelo, orgulho da gente.”

Chico Frota

Assessoria de Imprensa do GRES São Clemente.

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